segunda-feira, 7 de junho de 2010

OS PROFETAS DE UMA TERRA PROMETIDA: O “TERCEIRO SETOR”.

O objetivo deste artigo é refletir a respeito de algumas concepções recentes sobre o que se convencionou chamar de “terceiro setor”. Partindo do pressuposto de que há na sociedade três segmentos sociais distintos, aprisionados ao mundo das aparências, alguns estudiosos realizam reflexões, críticas ou não, sobre o significado do chamado “terceiro setor”. De modo geral, os pesquisadores do denominado “terceiro setor” esquecem a totalidade social, ignoram que as relações sociais de produção capitalistas determinam a sociabilidade humana e, desta forma, se emaranham em uma grande armadilha conceitual e ideológica.

AS MIRAGENS E FANTASIAS DO “TERCEIRO SETOR”: VOCÊ FAZ A DIFERENÇA.
Nesse campo (das novidades), diz Paulo Arantes (2000), não há conceito ou palavras que não exijam aspas, “Reforma do Estado”, “Administração Pública Gerencial”, “Sinergia”, “Parcerias Felizes”, “Proativo”, “Reativa”, “Sociedade Civil Eticamente Estruturada”, “Incorporação da Cidadania”, “Marketing Social”, “Empresa com Responsabilidade Social”. Como dar o nome certo à coisa certa?
As empresas capitalistas são agora cidadãs, cidadania passa a nomear um novo campo de negócios bastante animado. Negócios que seguem os princípios do gerenciamento estratégico e que disputam nichos de mercados solidários.
Com perdão da má palavra, o fato é que também existe um mercado atraente para as iniciativas cidadãs. Ocorre simplesmente que a mais estrita observância da cláusula sem-fins-lucrativos não é uma barreira à entrada no mundo dos negócios, podendo até representar uma senha privilegiada de ingresso. Segundo consta, a paulatina impregnação pelos usos e costumes da livre iniciativa começa pela inocente elaboração e execução de um ‘projeto’ em conformidade com as exigências de qualquer financiadora (...). Está claro que a carga simbólica que imprime uma ‘aura positiva’ às ações voluntárias sem fim lucrativo não decorre apenas da sua inegável funcionalidade na legitimação das políticas sociais compensatórias recomendadas pelos próprios patrocinadores da devastação econômica em andamento. Tampouco, como quer o discurso edificante corrente, derivaria da pressão moral exercida sobre os agentes econômicos para que se sintam concernidos pela ‘nova cultura de participação cidadã’, como se diz na língua geral do momento. (ARANTES, 2000, p. 6-7, grifos nossos)
Portanto, a miragem do “terceiro setor” emergirá como um “messias motivador”, o poder simbólico da “santíssima trindade” (FERNANDES, 1994). Uma relação triangular harmônica possibilitará a integração entre o Estado (voltado para os interesses universais), o Mercado (calmo e generoso) e a “Sociedade Civil-Terceiro Setor”, ou seja, uma regulação moral da reprodução social no interior do capitalismo monopolista em sua fase de acumulação predominantemente financeiro-predatória.
O surrealismo da empresa que não visa lucro, mas se interessa exclusivamente pelo retorno ético da cidadania como novíssimo fator de produção, responde a essa esquizofrenia de base de um mundo inteiramente racionalizado pela economia monetária, e por isso mesmo sem saída. (...) É que a saída de cena do socialismo tornou evidente, entre outras verificações cruciais, que ele não era apenas um ‘modelo’ equivocado ou irrealista – como se a loucura privatista fosse uma ‘espécie de filtro moral sem o qual a civilização moderna revela-se totalmente incapaz de existir, a economia de mercado sufoca em sua própria imundície (ARANTES, 2000, p.14, grifos nossos).
Todas essas novidades edificam, na realidade, uma grande armadilha ideológica que oculta as raízes estruturais do crescente exército industrial de reserva e a conseqüente precarização e flexibilização do trabalho no mundo.
Felipe Luiz Gomes e SILVA.
(Extrato inicial e final de texto com o mesmo título).