sexta-feira, 9 de abril de 2010

Capitalismo da miséria (1)

A miséria é uma categoria total, ou seja, macula e determina o caráter de todos os momentos da reprodução social.
Nascemos da miséria ibérica e suas determinações imanentes: sociedade miserável feudal-mercantil. Fomos paridos por revoluções burguesas conservadoras ideadas por uma nobreza altamente vinculada aos negócios do capital. Criava-se um território real do e para a acumulação do capital a todo o preço, sem peias de qualquer tipo, sequer as religiosas, pois a igreja participava solidariamente do empreendimento colonial. Território colonial do capital, das classes que participavam do negócio: nobreza, clero, burguesia. Desta, dos seus poucos membros inicialmente imigrados parcela significativa de pequenos burgueses recém cristianizados, ex-judeus, ou seja, recém despojados de sua religião ancestral. Momento nuclear da organização da revolução conservadora é a Inquisição, criação política hispano-clerical-monárquica espraiada a Portugal, de repressão à burguesia ascendente após a Reconquista - já bem instalada entre as famílias dos novos grandes de Espanha - assim como das revoluções política, científica e religiosa vinculadas à ascensão burguesa que já davam o ar de sua graça em outros reinos europeus. A revolução burguesa conservadora é desse modo, reação contra-revolucionária em todos aqueles campos da reprodução social contrastantes com os seus limites monarquico-clericais. Foi, no caso ibérico, processo de longa duração, todavia vigente e seu significado esteve e permanece sendo a contenção máxima da emancipação em limites gritantemente rebaixados com relação aos processos da transição capitalista das revoluções burguesas radicais quanto das demais etapas dessa transição ocorridas nos séculos XIX e XX. Rebaixamento ao nível do desumano, do escandaloso, do incrível, do grotesco, do fantástico. Nascidas da desumanização radical dos proletários paridos na escravidão, suas classes burguesas tornam-se naturalmente costelas desse marco zero da humanidade, pois sustentáculos da manutenção desse modo de ser da acumulação do capital e, portanto, entes igualmente desumanos. Daí poder-se falar em forma específica de desenvolvimento capitalista, redundante em capitalismos da miséria. (SP, 9/03/2010)